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quarta-feira, 11 de maio de 2011

A rotina de um departamento de desenvolvimento de produtos




Autor: Ricardo Pedro
Especialista de Pesquisa e Desenvolvimento, que, a partir desse ano, desenvolverá artigos técnicos e cursos em cosméticos e saneantes para a revista H&C

O título é uma provocação ao leitor, pois se tem algo com o qual o departamento de desenvolvimento não lida é a rotina. E isso é exatamente o desafio maior dos profissionais que trabalham nesta área, uma vez que estão sujeitos ao desenvolvimento de produtos que atendam a velocidade das mudanças do mercado, sejam moda, modismos, tendências ou megatendências. Dizemos desafio porque para cada fórmula desenvolvida, subentende-se a realização de diversos testes (de eficácia, segurança e estabilidade) muitas vezes mais demorados e onerosos que o próprio desenvolvimento da formulação e, obviamente, mais morosos que as mudanças de mercado.
Desenvolver não é somente criar ou adaptar uma fórmula, uma embalagem, um conceito, é algo maior que tudo isso. E falar sobre desenvolvimento de uma forma simples para auxiliar o entendimento dos profissionais iniciantes nesta interessante área é o nosso objetivo nesta série de artigos. Para muitos leitores, nossa abordagem não será novidade, mas poderá ser ao menos encarada como uma reciclagem. Nesta série de artigos, serão abordados os diversos estágios do desenvolvimento de um produto, sua importância, suas etapas, dificuldades e atividades específicas.
O presente artigo é, então, o primeiro de uma série extensa. E, por isso, nada mais óbvio que seja o mais abrangente possível e mostre ao leitor os temas que serão abordados posteriormente.


O desenvolvimento de produtos

No estágio inicial do desenvolvimento de um produto, o profissional visa criar uma nova fórmula que atenda aos requisitos de marketing, que por sua vez, atenderão às necessidades ou expectativas do consumidor, este último podendo ser uma pessoa física ou mesmo uma empresa. Nesta série de artigos, consideraremos o consumidor como uma pessoa física.
As diferentes atividades desempenhadas pelo profissional de desenvolvimento de produto são todas muito relacionadas às atividades do departamento de marketing. Estes dois departamentos devem trabalhar em perfeita sintonia e sincronia.
“Marketing é a área de conhecimento que estuda os processos de troca; troca de produtos e serviços associados por satisfação dos clientes, objetivando como resultado o lucro” (Philip Kotler).

Toda empresa se insere em um grande ambiente de negócios composto por um microambiente e um macroambiente. O microambiente pode ser influenciado ou controlado em favor da empresa, porém o macroambiente por ser mais amplo é de caráter incontrolável e envolve os ambientes econômico, legislativo, político, cultural, tecnológico, governamental e social. As mudanças no macroambiente influenciam muito os negócios da empresa, que minimiza seus impactos atuando nas variáveis controláveis em seu ambiente, ou seja, na área de produção, finanças, comercial, recursos humanos e de marketing por meio de atuação nos 4P’s (mix de marketing).
Os 4P’s são cruciais para obtenção e manutenção de clientes e, portanto, manutenção dos negócios e resultados financeiros da empresa. É um conjunto de decisões básicas sobre o que se vai ofertar para um público que se quer atender dentro de um determinado ambiente. Uma das variáveis controláveis é o P de Produto. As decisões de produto envolvem como a empresa visa satisfazer as necessidades de mercado. A empresa satisfaz e cria um vínculo com o cliente por meio de um produto, dentre outras coisas.
Produto ou serviço é aquilo que a organização oferece a um mercado para a satisfação de um desejo ou necessidade. Simplificadamente, o produto é o que a empresa troca com o cliente. É um bem material (tangível) ou imaterial (intangível) oferecido a um mercado, visando à satisfação de um desejo ou necessidade. Conhecem-se os seguintes tipos de produtos:

• tangíveis (bens materiais), que podem ser duráveis (por exemplo, automóveis, vestuário, máquinas industriais) ou não-duráveis (por exemplo, cerveja, xampus, alimentos);
• intangíveis (bens imateriais), que podem ser serviços (por exemplo, salão de cabeleireiro, manutenção de equipamentos industriais), pessoas (por exemplo, um atleta, um político), locais (por exemplo, Rio de Janeiro, Fortaleza), organizações (por exemplo, Unicef, igrejas) ou, finalmente, idéias (por exemplo, planejamento familiar, vacinação).


Além disso, um produto pode ser classificado como de consumo (por exemplo, xampu) ou industrial (por exemplo, máquinas para uma fábrica).
O produto deve ter características que o personalizem e estabeleçam uma individualidade, cabendo aos departamentos de desenvolvimento e de marketing decidir sobre suas características. Tais decisões envolvem definições quanto a marca, nome, logo, embalagens, cor, sabor, odor, funcionalidade, serviços, design, tamanho, rotulagem, qualidade, entre outras.
Nas decisões de produto, o desenvolvimento e gestão de marcas são cruciais, pois as marcas e suas identidades criam vínculos com seu público-alvo, mas estas não serão abordadas nesta série de artigos.
Um produto, então, deve ser rigorosamente planejado. O planejamento do produto é algo mais complexo que o desenvolvimento do mesmo. Nesta etapa é importante analisar o macroambiente, estabelecer critérios para segmentação do mercado, mensurar o potencial dos segmentos, identificar as oportunidades para produtos/serviços, estabelecer alternativas de ação e, finalmente, desenvolver o produto.
O planejamento de produto visa definir o papel dos produtos e marcas dentro de cada segmento de mercado e avaliar a necessidade de desenvolvimento/lançamento de novos produtos e marcas.
Avaliar o produto dentro do segmento para o qual foi ou será criado permite tomar decisões mais acertadas quanto à definição de suas características, pois é muito mais fácil atender às necessidades de um segmento de mercado do que a do mercado como um todo.
O desenvolvimento de novos produtos envolve uma série de atividades multidisciplinares que não é função apenas de uma única área, mas de várias, como foco no consumidor. Incluem, entre outras, atividades relacionadas à análise do mercado, geração e seleção de idéias, desenvolvimento e teste do conceito, produção-teste, definição de estratégias de posicionamento com o mix de marketing adequado e após seu teste junto ao mercado, decide-se sobre o lançamento do produto e como isso será feito.
Os produtos novos podem ser classificados em inovadores, novas linhas, extensões de linha, aperfeiçoamento, reposicionamento e redução de custos. Em cada caso, as atividades de desenvolvimento serão distintas. Para desenvolver um novo produto é necessário ter alinhamento com as estratégias corporativas e de marca, foco no cliente, sendo crucial os testes com o consumidor, valer-se de pesquisas já realizadas, criar equipes multidisciplinares e observar a concorrência e outros mercados.
A aceitação de um novo produto cosmético envolve atitudes do consumidor que passam por estágios como consciência, interesse, avaliação, experimentação e adoção. Provocar as atitudes positivas do consumidor em cada um destes estágios é tarefa de Marketing. Por exemplo, o interesse do consumidor pode ser gerado por uma promoção, uma propaganda, a avaliação por uma distribuição de amostra grátis e a adoção por uma oferta justa de preço ou, melhor dizendo, custo-benefício.
Sabendo-se disso, estratégias devem ser definidas para atuação em cada um dos estágios de aceitação do novo produto de modo a maximizar o seu impacto.
Estes estágios normalmente constituem uma situação de decisão e estresse para os consumidores e, por isso, qualquer requisito que simplifique e facilite este processo é de crucial importância. Os consumidores se cansam ao comparar as numerosas ofertas, produtos ou serviços que muitas vezes têm pouca diferenciação. A marca é um instrumento que simplifica este processo tedioso para o cliente.
O profissional do departamento de desenvolvimento, após entender quais são as necessidades e expectativas dos consumidores e/ou oportunidades oferecidas pelo mercado, passa então a concretizar seu atendimento na forma de um produto e/ou serviço associado. Na Cosmetologia a maioria dos produtos são formulações que contêm inúmeros componentes compatibilizados para "ofertarem" um efeito, seja de limpeza, manutenção, higienização, tratamento e/ou embelezamento.
Em geral, como os produtos cosméticos são usados em longos períodos, o formulador deverá garantir sua estabilidade ao longo do período de uso. A estabilidade de produtos cosméticos será um tema específico abordado nesta série de artigos.
Avaliações grosseiras destes protótipos iniciais poderão ser efetuadas, para garantir que estes não apresentem logo de início sinais de instabilidade. Para tanto, se prepara uma série de amostras semelhantes, mantendo uma ou duas a 45°C a 50°C. Isto permite obter informações preliminares sobre um grande número de formulações. Problemas grosseiros com estas primeiras amostras, como separação de fases óleo/água, mudanças drásticas na cor, odor ou formação de precipitados podem ocorrer muito rápido, da noite para o dia. Idealmente, o formulador deverá ser capaz de identificar os problemas logo no início e selecionar formulações que apresentem dificuldades menores. À medida que o processo de otimização da fórmula continua, amostras adicionais devem ser testadas por períodos de tempo prolongados para avaliar profundamente os efeitos do envelhecimento sobre o produto. Baseado nestas informações de dados de estabilidade, o formulador poderá aprimorar a fórmula de modo a minimizar ou eliminar os problemas observados.
Estes painéis de estabilidade são úteis para determinar a direção a seguir no desenvolvimento da formulação e revelar problemas primários de estabilidade. Uma vez estabelecidos os protótipos finais, deve ser realizado um estudo completo para avaliar o maior número possível de problemas potenciais e confirmar a compatibilidade das matérias-primas. Isto deve ser efetuado com suficiente número de amostras, em cada condição de armazenamento, para fornecer dados consistentes.
Além disso, estudos mais aprofundados são apropriados para revelar as mudanças relativamente pequenas ocorridas nas características organolépticas de um produto (especialmente com relação à cor e à fragrância), responsáveis por impacto significante na percepção do consumidor. Apesar de alguma variação ser aceitável - virtualmente não se espera que um produto permaneça 100% inalterado por longos períodos de tempo - tais mudanças não devem ser perceptíveis pelo consumidor.
Alguns produtos têm maior tendência para desenvolver problemas de formulação que outros. Por exemplo, produtos baseados em emulsões são por natureza menos estáveis que aqueles em solução.

Fatores importantes no desenvolvimento do produto
O desenvolvimento de um produto demanda muito tempo para sua conclusão e na prática muitas vezes acaba se tornando um processo contínuo, enquadrando-se nas premissas básicas do sistema de qualidade de uma empresa, ou seja, faz parte das exigências de melhoria contínua impostas pelo mercado.
O desenvolvimento deve prever tudo que se passará com o produto, desde aspectos físico-químicos, microbiológicos e de desempenho até aspectos mercadológicos, como por exemplo a necessidade de aprovação de fornecedores, matérias-primas, formulações e processos alternativos, visando assegurar o posicionamento do produto, segundo sua qualidade e competitividade em períodos de crise econômica, sazonalidade e indisponibilidade de matérias-primas, modernização de equipamentos e mudanças de hábitos do consumidor, entre outros.
Os principais tópicos relacionados ao desenvolvimento de um produto são apresentados a seguir.

Matérias-primas
Em alguma etapa do desenvolvimento do produto será possível chegar à conclusão de que o mesmo é estável. No entanto, poderão ser exigidos testes adicionais para qualificar fornecedores alternativos de matérias-primas, para o caso de necessidades eventuais. Infelizmente, apesar das matérias-primas de diferentes fornecedores terem a mesma designação, por exemplo, como a nomenclatura do CTFA (Cosmetic, Toiletry and Fragrance Association), elas poderão não ser quimicamente iguais, pois a sua fonte de suprimento de insumos químicos e as condições de fabricação e processamento variam entre os fornecedores. Por este motivo, uma matéria-prima do fornecedor “B” não poderá ser inserida automaticamente em um produto desenvolvido com matéria-prima do fornecedor “A”. O impacto de mudanças nas matérias-primas que, à primeira vista pareçam mesmo inconseqüentes, devem ser determinados por testes de estabilidade.
Testes de desempenho
Idealmente, os testes de desempenho devem ser simples para obtenção de respostas rápidas às diferenciações de fórmulas e realizados imediatamente antes dos testes de estabilidade. Podem ser adotados métodos padrão (como por exemplo, testes de espuma em xampus) ou ainda avaliações sensoriais com painéis de pessoas da empresa, público consumidor alvo ou profissionais de beleza.
Variáveis de fabricação
Existem mudanças não químicas que podem também alterar a estabilidade do produto. Uma modificação no processo de fabricação pode causar complicações que resultam em um produto menos estável. Mudanças no processo às vezes são necessárias, afinal, trabalhar em um béquer de 1 litro é diferente de trabalhar num tanque de produção de vários litros.
Alterações na ordem de adição das matérias-primas poderão ser necessárias para reduzir o tempo de processamento, mudanças nas velocidades de aquecimento e resfriamento podem ocorrer devido a diferenças na transferência de calor em lotes maiores e condições diferentes de mistura podem alterar o nível de cisalhamento que o produto sofre.
Qualquer destas mudanças poderá causar problemas de estabilidade não evidentes em lotes produzidos em escala menor. A única forma de sentir no produto final o verdadeiro impacto de mudanças do processo de fabricação é avaliar amostras preparadas nas condições reais de produção, sendo, portanto, muito útil realizar testes de estabilidade e desempenho com produtos fabricados em escala industrial.

Considerações de embalagem
Mesmo quando a formulação e os processos de fabricação são mantidos constantes, variações no material de embalagem podem causar problemas. Nem todas as embalagens seguem o mesmo processo de criação, por exemplo, vidro e plástico se comportam diferentemente, e diferentes tipos de plásticos têm diferentes comportamentos quanto a propriedades como permeabilidade ao oxigênio, fixação da cor e resistência térmica, entre outras.
Certamente, uma nova combinação de fórmula e embalagem deve ser testada quando há mudança em um dos componentes da fórmula, fornecedor e processo de fabricação.

Ensaios de estabilidade
Em primeiro lugar, é importante saber o motivo da realização dos testes: a preocupação é apenas com a aparência do produto ou pretende-se determinar se as características específicas de desempenho mudam com o tempo? O objetivo do estudo influenciará o número de amostras necessárias e como serão acondicionadas. Controles e condições apropriados deverão ser escolhidos caso se deseje resultados significantes para os testes. Isto poderá necessitar, por exemplo, um estudo paralelo de amostras sem essência ou sem corante para avaliar a interferência destas variáveis. Normalmente, deve-se acondicionar uma amostra em frascos de vidro e outra na embalagem final do produto, para determinar se as mudanças observadas são resultado da interação entre fórmula e embalagem.
Os testes são efetuados com um protótipo de desenvolvimento ou com a fórmula final? Se por exemplo, a cor e a fragrância finais não foram ainda desenvolvidas pode-se testar a base da formulação. É claro que o sistema final deverá ser testado, mas com os resultados de avaliações preliminares o formulador terá mais tempo para atuar frente a eventuais problemas.
Cada empresa pode estabelecer seus próprios procedimentos de análise com relação ao número de amostras a analisar e quanto às condições que irá submetê-las. Normalmente, estes procedimentos estipulam o armazenamento em condições de temperaturas muito baixas a elevadas, de congelamento ou descongelamento e exposição a vários tipos de luz. A estocagem em temperaturas elevadas é crítica, já que a intensidade e a velocidade das reações químicas de decomposição praticamente se duplicam a cada dez graus de elevação da temperatura. Isto permite que se verifique algum problema mais rapidamente que na temperatura ambiente. Há a desvantagem potencial, que em temperaturas elevadas é possível que se esteja induzindo a ocorrência de reações que normalmente não ocorrem em temperaturas mais baixas. As condições de estocagem mais comuns usadas na avaliação da estabilidade de cosméticos são 50°C, 45°C, 37°C ou 35°C, temperatura ambiente, 25°C, 8°C a 4°C, congelamento ou descongelamento, e exposição à luz fluorescente e solar.
A maioria dos protocolos de testes de estabilidade pede avaliações de amostras em intervalos fixos. Datas típicas de controle são 1, 3, 6, 9, 12 e 24 meses. A cada data de controle são registradas as propriedades críticas. Isto consiste de uma bateria de testes que são tipicamente aplicados para avaliar a estabilidade do produto e incluem a análise de atributos físicos como cor, aspecto, viscosidade e densidade, testes químicos, como dosagens de ativos diversos e controle microbiológico.
Para avaliar possíveis interações entre a fórmula e a embalagem é importante verificar parâmetros como: perda de peso, mudanças na cor do plástico e odor, além de outros fatores relacionados à embalagem.
Com base nestes dados, é determinada uma faixa de especificação para cada característica chave do produto. Se o produto se mantiver dentro da faixa especificada dentro de um período determinado de tempo este pode ser considerado “estável”. É importante ter em mente que esta decisão é subjetiva e que ninguém está totalmente livre de riscos envolvidos na seleção da fórmula.
No próximo artigo, abordaremos como as matérias-primas podem ser selecionadas para o desenvolvimento de uma formulação destinada a atender uma necessidade específica de mercado.



Fonte:http://www.freedom.inf.br/artigos_tecnicos/default.asp

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